sábado, 13 de junho de 2015

PAPO CORAÇÃO

Marcos Fabrício Lopes da Silva*


O papo hoje não é cabeça. É coração. Sugiro como trilha sonora para a nossa conversa: Metal contra as nuvens, na voz marcante de Renato Russo, cantor da Legião Urbana. No amor, vale tudo: não! O amor ainda é tudo: sim! O bem mais valioso que você pode dar a outra pessoa é um bom exemplo. Naturalidade e calma fazem o mel do melhor interpessoal. Procure cumprir todas as promessas que fizer ou apresente um bom motivo para não as cumprir. Ninguém é perfeito, porque a perfeição tem o grave defeito de não incluir o ser humano. Não seja exigente consigo e com o outro, porque a rigidez não significa padrão de qualidade. Qualidade acontece quando colhemos os benefícios do estímulo mútuo, com valorização de verdade. Mostre ao amante as esperanças, os objetivos e as aspirações que você tem em relação a ele. Busque também compreender o mesmo. Melhorando o silencio, falar assopra, e escutar acolhe. Se é para ter preocupação que seja com o justo. Mesmo assim, cuidado: a verdade tem dois lados e não assume o lado de ninguém.

Faça o melhor para processar devidamente os fatos. Ouça as várias versões de uma mesma história, mesmo que você tenha testemunhado o “incidente”. A crise é a chance que a humanidade se deu para amar ao próximo como a ti mesmo. Procure ser, portanto, um exemplo de cortesia, boas maneiras e espírito esportivo. Nossos amantes são como espelhos. Eles refletem nossas atitudes na vida. Estimule o senso de responsabilidade. A liberdade agradece. Quebre rotinas monótonas, pois o tédio é o amor morrendo à míngua. Seja autêntico sem ser rude. É possível, além de não ter contraindicação. Diga “não sei” sem medo de ser feliz. Procure saber sem medo de se arriscar. Não brinque com a palavra: eu te amo. A seriedade não é o caminho do meio. O meio é a massagem amorosa. Não a confundir com mensagem egóica. Ao invés de gastar energia excessiva com o pedido de desculpas, canalize suas boas intenções para viabilizar gestos edificantes e retratadores. Perdão e pecado podem ser um transtorno bipolar, quando a cultura da culpa aciona o tribunal da consciência. Quem tolera cobra a fatura depois. Amor é de graça, com graça e pela graça. Espontaneidade 100% como horizonte afetivo. Na caminhada, somos capazes de lindos gestos nesse sentido.

Aprenda a contar uma boa história: chama casamento... muito mais que Santo Antônio. Uma boa história pode desenvolver no íntimo o desejo de saber mais sobre a vida em comunhão. Viver é lindo. Conviver, lindo em dupla. Se a tônica é individual, viva então. Se a tônica for relacional, conviva de fato. Esteja preparado para o inesperado, porque amar só vem com atenção às entrelinhas. Incoerente ser “menos”, se a busca se dirige à expressão do mais elevado dos sentimentos. O melhor preparativo para o amor é o uso certo da autoestima. O fracasso não é fatal, nem a solução, definitiva. Importante assimilar que vivemos na corda bamba entre a visão e a viseira. O nome disso: equilibração. O amor da sua vida merece todos os elogios do mundo. E as críticas também. Somos o “estranho-familiar” de nós mesmos. Portanto, capriche nas projeções e nas transferências para não reduzir o outro ao idêntico. Húmus dão flores. “Humano demasiadamente humano”, Nietzsche diria.

Declare pessoalmente, de forma aberta, os dons, os talentos e as características positivas que observar em companheiras e companheiros. Desenvolva uma nova forma de ver o tesouro, tesourinho. Quando olhar para ele, enxergue além do óbvio. “Realismo esperançoso”: melhor que idealização. Romantismo sem Realização leva a gente a infernal discussão sobre sexo dos anjos. O mar é tão vasto que só o barco pequeno é capaz de navegar. Não se engradeça, nem se apequene. Amar solicita “ambos expandidos”. Como pássaros, precisamos desinventar as gaiolas. Quem domina, não (se) compreende.

Gentileza: passe um tempo a mais com o amor que dificulta sua vida. Fácil, imagina a seta. O alvo dança para o bem do sistema. Estimule a curiosidade pela compreensão, pois o amor é lírio, colírio e delírio ao mesmo tempo. A emoção é o controle de qualidade da razão. A respeito, Maiakovski sobe o nível da conversa: “Nos demais, todo mundo sabe, o coração tem moradia certa, fica bem aqui, no meio do peito... mas comigo a anatomia ficou louca. Sou todo coração – em todas as partes palpita”.

Amores sábios estabelecem limites saudáveis. Mostre preocupação pelos problemas e dificuldades que o denguinho enfrenta ontem, hoje e amanhã. Estenda a mão e guarde o dedo de seta. Na hora da raiva: conte até mil e uma noites que sara! Ofereça água e não gasolina para a sede de si com o outro. Fugir também é do amor, quando ficar significa teimar. Persistir na linha do perseverar ajuda a qualificar a peleja do enamorar. Benzinho adora ser aceita como é e como não é. Mantenha-se envolvido até no distanciamento. Escute Clarice Lispector: “pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que somando as incompreensões é que se ama verdadeiramente”.

Intimidade é uma coisa; intimidação, outra. Resignar-se a jamais decifrar alguém. Leia-se: amor harmonioso. Quem não quer? Diana Corso explica: “um rio separa os amantes, travessias são possíveis, mas as margens não se fundirão”. Cada um na sua com muita coisa em comum. Faz bem esse sentido. Preserva as fontes, celebra as pontes. Cama é uma delícia; cama com mesa-redonda, melhor ainda. Já ouvi dizer que o amor é simples, mas a gente o complica. A complicação surge por conta de mesquinharias e picuinhas que desbotam o humor da gente. “Amor Humor”, dupla dinâmica já ressaltada por Oswald de Andrade. Sub-zero: desamor, tumor (evitemos!). Acredite incondicionalmente: o respeito é a ética do amor. O amor, a poética do respeito.


* Professor da Faculdade JK, no Distrito Federal. Jornalista, poeta e doutor em Estudos Literários pela Faculdade de Letras da UFMG.

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